domingo, 11 de novembro de 2007

Texto de Formação IV - Milton Santos e Denise Stoklos

O texto deste mês é, na verdade, um entrevista. Duas figuras de destaque em suas respectivas áreas: a autora, diretora e atriz Denise Stoklos e o respeitadíssimo geógrafo Milton Santos falam à Folha de S. Paulo em março de 2000.
A entrevista não é muito longa, mas pode ser o pontapé inicial pra que a gente passe a conhecer melhor esses dois pensadores muito competentes e muito brasileiros.

Milton Santos - Quando é que você formulou essa idéia de que o Brasil tem de ser repensado de forma autônoma?

Denise Stoklos - Eu tive sorte de ter 18 anos em 68, de estar na universidade naquela época. Nunca fui líder estudantil, nunca fui presa, torturada ou exilada por imposição. Mas convivi com colegas que tinham liderança e com os quais eu entendi que não era possível pensar o Brasil de uma forma macro, porque tudo naquela época era tão difícil, pequeno e limitado. E isso me acompanhou por todo o tempo, desde que sai da universidade e comecei minha vida teatral, vindo para São Paulo e Rio. Quando comecei a ser vista como uma boa atriz na juventude, o único caminho era tornar-me intérprete de novela de sucesso. Não havia possibilidade de encontrar companhias ou grupos que desenvolvessem uma linguagem própria, o medo era grande...

Santos - ...Era a manifestação da cultura própria dificultada pela emergência da indústria cultural...

Stoklos - ...Exatamente. Repetir a indústria cultural era o único desenvolvimento aceito, apropriado a qualquer ator, diretor ou autor que quisesse continuar aqui. Era muito insatisfatório para mim, que escrevi minha primeira peça aos 18 anos, sobre o tema da mais-valia. E não poderia escrever sobre outra coisa: aquilo era fruto da minha geração, não da minha autoria.

Santos - Quer dizer, era a vontade de afirmação da cultura nacional como afirmação do povo brasileiro. Talvez esses 500 anos pudessem ser úteis para isso...

Stoklos - ...Ou pelo menos que a gente não pudesse passar por isso tudo de novo...

Santos - É curioso. Penso que nas ciências humanas temos o mesmo problema. A diferença é que eu levei meio século para descobrir isso, e você descobriu mais rapidamente... A maneira como interpretamos o Brasil e o mundo é empobrecida na universidade porque somos extremamente copiadores -primeiro da Europa e agora dos EUA. Não se trata de recusar o pensamento que vem de outros países, mas há uma maneira própria de ver o mundo e a si mesmo. É isso que distingue as culturas e dá nervo aos povos. Nós não chegamos a ser universais porque não somos suficientemente brasileiros. Relendo suas peças, encontrei esse ponto que nos aproxima, que é retirar do país as suas próprias forças para entender o mundo e melhorar o Brasil. Estamos atravessando uma fase de desmanche de muita coisa. Isso nos deixa preocupados e, ao mesmo tempo, nos dá força para enfrentar a tarefa.

Stoklos - Quando li pela primeira vez o seu livro "A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção" (ed. Hucitec, 1996), tentei captar o seu raciocínio de geógrafo e descobri verdadeiras epifanias. Por isso que eu cito tanto o seu pensamento, mesmo com receio de fazer uma interpretação errada ou superficial da sua obra. O senhor proporciona ao mesmo tempo o rigor do pensamento e o convite à análise crítica. Acho muito interessante, por exemplo, quando o sr. diz que não estamos vivendo uma época da comunicação, como se apregoa por aí, porque comunicação é emoção.

Santos - Esse aspecto mostra também a diferença entre o artista e o homem da universidade na direção da verdade. O grande artista é livre e sabe que, se não houver emoção, ele não se aproxima da verdade. E o homem da universidade imagina que tem de reprimir a emoção para produzir. As ciências humanas, brasileiras e latino-americanas, acabam não interpretando os respectivos países porque olhamos para a interpretação que é dada a outra história. Como está claro no seu texto "500 Anos - Um Fax de Denise Stoklos para Colombo" (1982), por exemplo, a troca do espelhinho pelo ouro. Quer dizer, a gente busca se espelhar apenas e toma isso como se fosse uma riqueza intelectual. Seu trabalho no palco é uma cruzada. Minha impressão é que ele repercute algo que é profundo na alma brasileira e está buscando intérpretes... A cultura tem de vir com o território, com o povo, com a história se fazendo.... É um conjunto que inclui possivelmente essa preguiça intelectual, essa comodidade de pegar os espelhos e usá-los adequadamente.

Stoklos - E a gente raspa, assim, as palavras suas... Pega aquilo e se agarra como se fosse uma bóia no naufrágio. Quantas vezes um simples pensamento nos conduz a praias mais iluminadas... Volto ao seu pensamento da emoção, de que o pobre, o destituído, ele se comunica por causa da emoção, por estar com a emoção... Eu não fui instruída para trabalhar com isso. Era complicado lidar com a emoção, principalmente porque vivíamos uma época difícil. As coisas nesse país têm a aparência e o significado fica por baixo, que é muito mais forte. Só que as coisas não mudaram, mesmo com essa chamada democracia legitimada pelo voto, que não significa nada. É pior, porque traz o fantasma desse "legítimo"...

Santos - ...É um consumo eleitoral...

Stoklos - ...Esse distanciamento entre a emoção e a leitura do real também nos criou uma dificuldade para se aproximar da nossa própria emoção. Houve essas pequenas sequelas, mas dá para reajustar. É a emoção, afinal, que está determinando que a gente não queira desistir e se entregar ao cinismo que todos os convertidos ao neoliberalismo assumiram, de que "é assim mesmo", "é mais um passo", "estamos evoluindo", "esse é o movimento global", "as novas leis são assim mesmo", enfim, é um cinismo absoluto. Não tem graça não ser cidadã, não ter compaixão, não ter reverência, enfim, tudo que nos é dado como único patrimônio, único no sentido de bom, de uno, não de pouco, de menos. E seu trabalho, professor, também nos pede essa emoção.

Santos - Aliás, foi uma descoberta recente. A maior parte do tempo eu era refreado. Recordo-me dos anos em que ensinei na França e nos EUA, entre as décadas de 60 e 70, e a minha volta ao Brasil, quando retomei contato com as pessoas daqui. Fui intelectual na Europa e nos EUA sem ser cidadão, era regido pela razão, pelo esquema. A descoberta dessa nova condição, dessa epistemologia da existência, como estou chamando agora. Quer dizer, o existir como condição para ver o mundo, e isso inclui, em primeiro lugar, a emoção. Porque a razão reduz a força de descobrir, porque só a emoção nos leva a ser originais. Não só a emoção, claro, mas por meio dela é mais depressa. Propor uma coisa nova na universidade é muito difícil, embora seja o lugar da proposição do novo. Essa força, digamos, de esquecer, de ser original, só a emoção permite. E ela então passa a ser um dado do pensamento, não é a razão que produz o grande pensamento. E aí é preciso caráter. Uma reinterpretação da sociedade brasileira em movimento permite ver, digamos, uma outra coisa, um futuro mais perto. Nós fomos tratados e educados para examinar o chamado presente, não imaginando que o futuro está aí, embutido no presente. Na realidade, cada ato nosso é presente, agimos em função do futuro. A ação é presente, mas a aspiração dela é o futuro.

Stoklos - O educador Paulo Freire já falava disso: só tem futuro quem tem presente. Essas pessoas são mutantes. Não estou falando daqueles que queimam índios ou dos chamados "mauricinhos", "patricinhas", que são apenas uma reprodução dos modelos que se conhece. Mas estou falando dos novos, que têm compaixão... Num país como o nosso, quem não tem compaixão está morto, literalmente.

Folha - Essa aceleração do presente, da qual o sr. fala, ficou muito clara no final do ano passado, com a ansiedade em torno da chegada do novo milênio.

Santos - O que chamamos de presente não existe. É um momento fugaz da realização de um futuro sonhado. O melhor gesto seu é baseado no futuro, não no presente. Então, acho que a primeira condição para a gente acreditar que o mundo vai mudar é descobrir que o presente não existe. Hoje já tem cartão de crédito para os menos pobres. Mas na minha juventude, nem dinheiro para comer tínhamos. Agora, a classe média "refabrica" o futuro com cartão de crédito, com inadimplências. O pobre não, ele tem pouco. Ele sabe que amanhã não será igual a hoje. E isso está chegando, está subindo até a gente também. O drama dos filhos sem perspectiva, o drama de quem quer se educar e não consegue.

Stoklos - Mas essa aceleração é dramática...

Santos - ...É dramática sim. Por isso, o papel de gente como eu, você e muitos outros -somos um certo número de pessoas que não nos conhecemos-, volta a ser central.

Folha - No ano passado, o sr. participou de um seminário do movimento "Arte contra a Barbárie", organizado em São Paulo por grupos como o Tapa, Folias D'Arte e Companhia do Latão. Como foi a experiência de conversar com a classe teatral?
Santos - Eu sentia falta desse contato com os artistas. Afinal, teoricamente eles são livres. Quer dizer, podem não ser na prática (risos). Bem, eu coloquei para eles um pouco do que estamos falando aqui. O que já não acontece com os colegas da universidade, pois estamos mais propensos à censura. A universidade possui uma estrutura de enquadramento que isola.

Stoklos - No solo, por exemplo, você não está sozinho no palco. No meu caso, não se trata de um monólogo de ficção no qual você vai lá e representa exatamente, e é aquilo. O espectador vai dizer: "Oh, que virtuosismo, como faz bem!". E vai embora como entrou. Aliás, para ir embora exatamente igual, nenhuma experiência de encontro vale a pena. O verdadeiro encontro é quando você se transforma. Talvez por isso nossa sociedade se prove tão injusta, porque a gente não se transforma ao encontrar o outro.

Santos - Quando fui trabalhar nos EUA, eu achava que tudo era espontâneo, até descobrir que a informalidade americana é absolutamente regulável. E faltava aquilo que tinha na França, que é jantar a quatro, a seis. Isso estimula você a falar, a dizer o que pensa. Foi aí que senti a diferença entre o encontro e o parto. Quando retornei ao Brasil, vi que tinha acabado também essa coisa da entrega do tempo como vida ao outro. O que talvez não aconteça com as pessoas pobres, senão elas deixariam de viver...

Stoklos - ...Elas só têm a própria presença...

Santos - ...E a do vizinho. Quando não existe a possibilidade do conflito criador e enriquecedor, quando não querem falar um com o outro, aí você é usado para falar pelos outros... Aliás, como é a competição no meio artístico?

Stoklos - Eu tenho a sorte de não entrar nesses embates. Escolhi um caminho isolado, tenho consciência disso. Faço questão de falar, para quem chega perto de mim, que isso não faz parte do ofício do artista.

Folha - Como o sr. vê a representação no teatro?

Santos - A minha educação artística é muito pobre. Ainda não me sentei para fazer a exegese dessa pobreza. O teatro constitui, vamos dizer assim, por destino, uma exposição de idéias universais. Acho que esse é o teatro genuíno. É daí que vem, consequentemente, a sua postura crítica. E foi assim durante séculos, a busca de coisas que são próprias do homem, essa fome de aperfeiçoamento. O teatro é ético, em suma.

Milton Santos - O geógrafo Milton Santos é dos pensadores brasileiros mais respeitados em sua área. Em 94, ele recebeu o Prêmio Internacional de Geografia Vautrin Lud, na França, uma espécie de Nobel da Geografia. Santos exerceu boa parte da carreira acadêmica no exterior (França, Canadá, EUA, Peru, Venezuela etc.). Atualmente, é professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. Santos publicou mais de 40 livros e 300 artigos em revistas especializadas. Entre os volumes publicados estão "Pensando o Espaço do Homem" (1982), "A Urbanização Brasileira" (1993) e "A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção" (1996), todos lançados pela editora paulista Hucitec. Santos é colaborador da Folha, em que escreve regularmente na seção "Brasil 500 d.C." do Mais!. Na sua opinião, só é possível fomentar o caráter na solidão. "Como consultar o outro para dizer o que você pensa?", questiona. Cita o poeta francês Victor Hugo como que para justificar a modéstia intelectual. "Ele dizia que o grande artista surge no ápice. Cada grande artista está no ápice, não importa a época, como Shakespeare e Ésquilo."

Denise Stoklos - Paranaense de Irati, Denise Stoklos soma 32 anos de carreira, na condição de autora, diretora e atriz. Seu nome está associado ao "teatro essencial", como denomina a linguagem que criou baseada "numa possibilidade cultural brasileira original, única". Corpo, voz e mente/intuição formam o tripé do trabalho. A atriz defende um "teatro que tenha o mínimo possível de efeitos e que contenha a máxima teatralidade em si próprio". Quando começou a ganhar projeção, no início da década de 80, seus espetáculos eram calcados sobretudo na mímica. São dessa fase, por exemplo, "Elis Regina" (1982) e "Mary Stuart" (1987). Aos poucos, gestos e movimentos incorporaram o verbo como signo complementar. Solos como "500 Anos - Um Fax de Denise Stoklos para Cristóvão Colombo" (1992, sobre o descobrimento da América), e "Des-Medéia" (1994) consolidaram o caminho de projeto iminentemente autoral. "Meu teatro é o jogo, é o brincar. O espectador brinca comigo ao concluir comigo, mas não brinca de que está vendo uma ficção. Acho que é uma coisa meio xamanística, no sentido do pajé de tribo que fica encarregado de chamar para o encontro a cada noite", afirma.

Jornal: Folha de São Paulo
Terça-feira, 7 de março de 2000.
Jornalista: Valmir Santos
Caderno: Ilustrada - Página 5-1.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Baden Powell - Afro-Sambas (1966) / Postado por Ivan e Júnior


Baden Powell é considerado um dos maiores violonistas de todos os tempos e um dos compositores mais expressivos da nossa música. Criador de um estilo próprio, foi o violonista mais influente de sua geração, tornando-se uma referência entre os violões havidos e a haver. Sua música rompe as barreiras que separam a música erudita da música popular, trazendo consigo as raízes afro-brasileiras e o regional brasileiro.


Baden nasceu no dia 06 de Agosto de 1937 em uma cidadezinha no norte do estado Fluminense chamada "Varre-e-Sai" e morreu em 26 de setembro de 2000 no Rio de Janeiro-RJ.

Baden Powell tinha uma maneira única de tocar violão, incorporando elementos virtuosísticos da técnica clássica e suíngue e harmonia populares. Ele explorou de maneira radical os limites do instrumento, o que o transformou em uma rara estrela nacional da área com trânsito internacional.
Conheceu Vinicius de Moraes em 1962, formando uma parceria musical, criando músicas como o Samba da Bênção, Samba em Prelúdio, Deixa e Canto de Ossanha.
Teve músicas gravadas por
Beth Carvalho (Samba do Perdão, parceria com Paulo César Pinheiro), Elis Regina (Samba do Perdão, Quaquaraquaquá, Aviso aos Navegantes), todas em parceria com Paulo César Pinheiro; Cai Dentro), Elizeth Cardoso (Valsa do amor que não vem, com Vinícius de Moraes).
Escolhemos um dos CDs de Baden Powell intitulado "OS AFRO-SAMBAS". Considerado por muitos críticos como um divisor de águas na MPB por fundir vários elementos da sonoridade africana ao samba carioca, "Os Afro-sambas" é o segundo LP lançado pela parceria Vínicius de Moraes/Baden Powell.
Faixas do CD "Os Afro-Sambas":

1-Canto de Ossanha (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 03:23
2-Canto de Xangô (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 06:28
3-Bocoché (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 02:34
4-Canto de Iemanjá (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 04:47
5-Tempo de amor (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 04:28
6-Canto do caboclo (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 03:39
7-Tristeza e solidão (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 04:35
8-Lamento de Exu (Vinicius de Moraes / Baden Powell) - 02:16

Ficha técnica:

Produção e direção artística: Roberto Quartin e Wadi Gebara
Técnico de gravação: Ademar Rocha
Contracapa: Vinicius de Moraes
Fotos: Pedro de Moraes
Capa: Goebel Weyne
Arranjos e regência: Maestro Guerra Peixe
Vocais: Vinicius de Moraes, Quarteto em Cy e Coro Misto
Sax tenor: Pedro Luiz de Assis
Sax barítono: Aurino Ferreira
Flauta: Nicolino Cópia
Violão: Baden Powell
Contrabaixo: Jorge Marinho
Bateria: Reisinho
Atabaque: Alfredo Bessa
Atabaque pequeno: Nelson Luiz
Bongô: Alexandre Silva Martins
Pandeiro: Gilson de Freitas
Agogô: Mineirinho
Afoxé: Adyr Jose Raimundo
OBS: O CD já está disponível na Cdteca do EMCANTAR.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

NOME - Arnaldo Antunes (por Marquinho e Mariana)


Como sugestão de obra para a ampliação do universo cultural e leitura de mundo, não poderíamos deixar passar a oportunidade de entrar em contato com uma obra inovadora como o DVD/CD NOME de Arnaldo Antunes.

Uma obra híbrida de linguagens como a escrita, a sonora e a audiovisual, que nos proporciona uma diversidade de impressões e leituras. Referência marcante de arte contemporânea.

Arnaldo Antunes lançou originalmente NOME em 1993 como um projeto multimídia composto de CD + VÍDEO + LIVRO. Em 2006, NOME foi relançado num kit composto por CD + DVD e encarte. O DVD NOME é composto de 30 videoclipes elaborados a partir de poemas e canções de Arnaldo Antunes.

Arnaldo Antunes - Poeta, compositor, cantor, etc. Um artista inovador nas suas produções, e que transita por várias linguagens artísticas. Um poeta "inclassificável", como ele mesmo se classifica, enquanto forma e estilo literário.

Em incentivo à pesquisa, aí vai uma tarefinha: conheçam melhor a singularidade de Arnaldo Antunes entrando no seu site
www.arnaldoantunes.com.br. Legal para conhecer melhor sua biografia, livros, textos, discos, artes, fotos etc. Além disso, o DVD NOME encontra-se no acervo do EMCANTAR.

domingo, 14 de outubro de 2007

Texto para Formação III

Gente, esse mês é a vez do professor Antônio Carlos. Nesse texto ele faz uma análise muito pertinente e atual sobre a questão: afinal de contas, pra que serve a Arte? Ele aponta possibilidades de respostas onde menos se espera: o mundo do trabalho. Trabalho entendido aqui não como a servil venda da força de trabalho, mas como construção da vida material de forma autônoma e criativa. Esse é mais um dos textos que tem nos ajudado a responder à pergunta: Por que investir na ampliação do universo cultural das pessoas? (O que ele chama de Educação Artística é o que estamos chamando de Edcuação pela Arte, ok?)

Boa leitura!!!

Educação Artística, Trabalho e Vida
Antonio Carlos Gomes da Costa

"Todas as pessoas têm disposição para trabalhar criativamente, o que acontece é que a maioria jamais se dá conta disso".(Truman Capote)
"Imaginar é mais importante do que saber, pois o conhecimento é limitado, enquanto a imaginação abarca o universo". (Albert Einstein)

Palavra inicial
“Educação Artística e o Ganha-Pão” foi o texto com que eu dialoguei para redigir estas páginas. Trata-se de um estudo sobre o significado da educação artística, para as perspectivas econômicas dos educandos, independentemente do ramo de atividade em que pretendam atuar. A primeira indagação é se a educação artística deve ser considerada um luxo, algo complementar ou meramente acessório em relação ao ensino das matérias essenciais, como línguas, ciências ou matemática. A resposta é não. O desenvolvimento da criatividade e do senso estético é, e será cada vez mais, um requisito importante para se ingressar, permanecer e ter sucesso no novo mundo do trabalho.

A arte na constituição do humano

A verdade é que somos animais lingüísticos e todas as formas de linguagem nos servem de meio de expressão oral, visual ou corporal. O fato de lembrarmo-nos do passado e imaginarmos o futuro permite planejar e agir de um modo que nos torna únicos entre os animais. A verdade é que somos capazes de produzir e, através da comunicação, fazer circular sentidos.A arte, ainda nos tempos das cavernas, permitiu ao homem compreender a atribuir sentido ao mundo e à sua atividade sobre ele. A capacidade de configurar sua experiência passada e presente e discernir o seu futuro, desde os primórdios da humanidade, é alguma coisa ligada indissoluvelmente à experiência estética.A vida, em geral, e o mundo do trabalho, em particular, valoriza e recompensa aqueles que apreendem e incorporam – em sua maneira de ver, entender a agir – os padrões novos que – cada vez com maior velocidade – emergem da experiência humana. Isso é particularmente válido para uma época de transição no processo civilizatório, como a que presentemente estamos vivendo.Foi através da arte que, pela primeira vez, o homem entendeu e representou o mundo em torno de si. A idéia é de que esta atitude não é alguma coisa, que ficou esquecida em algum lugar do nosso passado. Nós carregamos conosco essa capacidade de aprender a configuração do nosso mundo interior ou exterior e objetivá-la em algo dotado de sentido, sem ter, para isso, de recorrer à religião, à filosofia e à ciência. É nisto que consiste a experiência estética.O senso estético é uma maneira permanentemente válida de apreender o mundo e atuar sobre ele, através de uma atividade dotada de sentido. Isto é especialmente válido quando consideramos como objetivos da educação a realização das potencialidades do ser humano e a sua preparação para a cidadania e o trabalho.A ciência, a filosofia e a religião também exercem esse papel de preparar o ser humano para compreender e atuar sobre o mundo. Cada qual à sua maneira, essas formas de relacionamento do homem com o mundo natural e humano que o cerca constituem o que há de especificamente humano em nossa natureza, que é a cultura.

Um novo mundo do trabalho

Num mundo do trabalho que se “desmaterializa”, grande parte das habilidades específicas serão aplicadas por máquinas inteligentes, isto é, máquinas capazes de substituir, não somente o esforço muscular humano mas, em medida cada vez maior, o seu esforço cerebral.Numa situação como essa, as aptidões e destrezas manuais, a capacidade de seguir instruções, a prontidão para obedecer a comandos, a capacidade de concentração tendem a ser, cada vez mais intensamente, substituídas por habilidades básicas e de auto-hetero e co-gestão como: percepção do todo, capacidade de expressar-se, capacidade de manter-se auto-motivado e de motivar os outros, capacidade de contribuir criativamente na solução dos problemas em grupo, de construir em conjunto, de adaptar-se a novas situações, de ensinar e de aprender com os outros, capacidade de avaliar e de deixar-se avaliar.Num mundo do trabalho onde o emprego na área pública ou privada parece não ser mais a única e, a médio e longo prazos, nem a principal forma de inserção na vida produtiva, é preciso preparar as novas gerações de trabalhadores (não necessariamente de empregados) de forma inteiramente diversa daquela pela qual fomos preparados.Mais do que observadores de normas, seguidores de instruções e fiéis observantes das rotinas laboriais, o novo mundo do trabalho requer pessoas que sejam criativas, raciocinem e resolvam problemas e, sobretudo, que sejam capazes de autodeterminar-se, assumindo responsabilidades e correndo riscos, ou seja, criando o seu próprio futuro.

Educação, arte e trabalho

Hoje, já existem vários estudos que associam o aumento da escolaridade a ganhos em produtividade e renda por parte dos trabalhadores. Em razão disso, é crescente entre os empregadores o interesse em aumentar os níveis educacionais de sua força de trabalho. Esse interesse, no entanto, restringe-se ao ensino da linguagem, do cálculo e de habilidades específicas. A educação artística é vista como uma espécie de perda de tempo, algo inteiramente acessório, mais próximo do lazer que do trabalho, “um luxo”.No pólo oposto dessa visão encontramos os arte-educadores. Para eles, a educação artística justifica-se por si mesma. Sua importância está radicada no seu caráter autocriador do humano e seria quase uma afronta associá-la à educação profissional.Assim, nos deparamos com duas posições antagônicas, mas cujo resultado prático é exatamente o mesmo. A primeira, a de que a educação artística é tão sem importância, que não vale a pena considerá-la como algo de útil na preparação das pessoas para o mundo do trabalho. A segunda, a de que a educação artística é tão importante em si mesma, que é um rebaixamento considerá-la de forma pragmática, como uma modalidade entre outras de preparação para o mundo do trabalho.A posição que supera o falso dilema vivenciado nessa polarização desnecessária e estreita é a constatação de que a educação artística, tomada em si mesma, sem nenhuma submissão à dimensão produtiva, exerce sobre esta uma influência extremamente positiva. Isso quer dizer que a educação artística não deve e nem necessita tornar-se instrumento da educação profissional. Ela deve, isto sim, é converter-se num poderoso catalisador do desenvolvimento humano, tanto no campo da educação básica, como no campo da educação profissional. Nem paralelismo, nem incorporação, mas convergências e complementaridade.É certo que, seja para o jovem atuar como empregado no setor público ou privado, seja para atuar como auto-empregado, na economia informal, seja para atuar como empreendedor, em micro, pequenas, médias ou grandes empresas, a educação artística tem tanto a contribuir como a educação básica ou a educação profissional.A verdade é que, para trabalhar lidando com pessoas, com grupos, com idéias, com formas e relações as mais variadas, o ser humano deverá deter cada vez mais se polivalente, flexível, motivado, motivante e criativo.Os alunos que montam uma peça de teatro, por exemplo, aprendem:
- a atuar como uma equipe;
- a dirigirem e serem dirigidos;
- a expressar-se com a fala, o corpo e olhar;
- a programar-se dentro de um orçamento limitado;
- a buscar soluções criativas, inventando, adaptando e improvisando;
- a auto-hetero e co-avaliar;
- a ter disciplina de postura, de tempo e de lugar;
- a empenhar-se na busca da qualidade;
- a gostar e a valorizar o sucesso;
- a praticar a melhoria contínua e o respeito pela audiência;
- a repetir uma ação inúmeras vezes, aproximando-se gradativamente do que deve ser.
Nas feições do mundo do trabalho, que está surgindo nesta reta final de século e de milênio, alguns traços já se podem distinguir com nitidez:
- A qualidade deixa de ser diferencial competitivo e torna-se uma condição indispensável para se ingressar e permanecer no mundo do trabalho;
- O trabalho está se desmaterializando, ou seja, lidar com a informação e o conhecimento vai se tornando cada vez mais um requisito mais importante que lidar diretamente com matérias-primas. Esta é a característica mais marcante do ingresso na era pós-industrial;
- A robótica, a telemática e a informática virtualizarão, cada vez mais, o processo de trabalho, através de sons, imagens e símbolos, que o ser humano deverá ser capaz de acessar e aprender de forma instantânea.

O desafio da convergência

Um desafio para a cabal demonstração da convergência e da complementaridade dos mundos da arte e do trabalho, no âmbito da educação artística e no contexto da revolução pós-industrial, é a compreensão de como as habilidades desenvolvidas em um se aplicam ao outro.Nesse sentido, nos Estados Unidos, educadores estão desenvolvendo padrões curriculares e representantes da indústria vêm desenvolvendo padrões educacionais, com o objetivo de desvelar a compatibilidade e a fecundidade das relações da educação artística com as formas de organização e as tecnologias do novo mundo do trabalho.A medida em que esse trabalho se desenvolve, vai ficando cada vez mais claro que o conhecimento e a prática de habilidades artísticas pode desenvolver nos jovens competências fundamentais para o sucesso no mundo do trabalho e na vida, de um modo geral, no século 21.Três grandes eixos já foram identificados, como pontes seguras para o trânsito de benefícios da educação artística para o trabalho:
1º Eixo: habilidades desenvolvidas na educação artística podem ser transferidas para o trabalho e para a vida em geral;
2º Eixo: o conhecimento das artes potencializa a comunicação eficaz;
3º Eixo: a experiência estética propicia uma abordagem criativa à solução de problemas.
No plano objetivo, das artes se pode aprender a trabalhar com o tempo, o espaço, a luz, a cor, o som, o corpo, a voz, compromissos, agendas, recursos financeiros, meios de comunicação social, instrumentos de diversos tipos, materiais, tecnologia etc.No plano da subjetividade e da intersubjetividade, as artes propiciam o desenvolvimento de habilidades como trabalhar em equipe, planejar, negociar, liderar, ensinar, coordenar, acompanhar, avaliar, comunicar, administrar conflitos e gerar soluções criativas.Noções fundamentais como processo, raciocínio descontínuo, sistema e visão holística podem ser vivenciadas, através de atividades de educação artística, ao invés de serem apenas transmitidas em termos puramente conceituais. Isto sem falar nos conhecimentos, valores, atitudes, posturas, habilidades e destrezas, que a educação artística necessariamente desenvolve em todos os domínios da experiência estética.Essa nova maneira de ver a educação artística traz para os educadores, que atuam nessa área, novos e crescentes desafios:
- Desenvolver novas capacidades para o trabalho em equipe;
- Familiarizar-se com as novas tecnologias (informática e telemática);
- Abrir-se a outras culturas e a perspectivas distintas diante do trabalho e da vida;
- Buscar formas novas de aprender e ensinar o trabalho criativo;
- Dedicar tempo à busca e à transmissão das grandes mensagens modeladoras do trabalho e da vida na transição civilizacional que estamos vivendo;
- Construir pontes entre o mundo da educação artística e o mundo do trabalho;
- Divulgar a idéia de que, mais do que uma educação para a arte, a educação artística é uma educação para a vida, no sentido mais pleno do termo.

Conclusão

Estamos vivendo um período de transição civilizacional. A humanidade como um todo está ingressando em uma nova e decisiva etapa de sua evolução histórica.O mundo do trabalho sofre simultaneamente o impacto modelador de três forças:
- A globalização dos mercados, impondo novos patamares de exigência em termos de produtividade e qualidade na produção de bens e serviços;
- As novas tecnologias, que desvincularam, de forma definitiva, o crescimento da produção do crescimento do emprego e desmaterializaram o trabalho humano, levando a economia e a sociedade à era da informação e do conhecimento;
- As novas formas de organização do trabalho, que exigem um trabalhador diferente em tudo do tipo que prevaleceu no século 20.
As habilidades desenvolvidas pela educação artística, que eram periféricas e minoritárias no sistema produtivo, passam a ocupar uma posição central no perfil do trabalhador requerido pelas transformações deste fim de século e de milênio.Essas novas habilidades deverão ser desenvolvidas em três cenários:
- Escola
- Ações complementares à escola
- Educação profissional para e pelo trabalho

Em todos esses cenários, a posição ocupada pelo binômio arte-educação deverá ser ampla, profunda e corajosamente revista. Esta é uma causa pela qual vale a pena lutar.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Arquivo Sonoro

Bom pessoas, essa é um postagem do Ênio, Mirtes e Ioleides, na tentativa de contribuir um pouco na ampliação do universo cultural de todos que ouvirem esses 02 cds. Não encontrei muitas informações sobre esses 02 albuns postados, mas vale a pena ouvir é muito interessante.
Os 02 cds já estão disponíveis na cdteca do EMCANTAR.


Bobby McFerrin

Um dos vocalistas mais importantes do jazz nos anos 80, Bobby McFerrin nasceu em Nova Iorque em 1950 e estudou piano em uma universidade californiana. Começou a carreira de cantor se graças ao amigo comediante Bill Cosby, e, em 84, lançou “The Voice”, disco que entrou para a história do jazz por conter apenas voz, sem qualquer outro instrumento. Ao longo dos anos 80 e 90, McFerrin gravou com parceiros como Herbie Hancock, Yo-Yo Ma e Chick Corea álbuns de relativo sucesso. Em 88 alcançou o topo das paradas pop com o single “Don’t Worry, Be Happy”, do disco “Simple Pleasures”.


The Swingle Singers

Grupo vocal que nasceu em 1962 em Paris e já está na sua 4ª geração e integrado por 08 cantores. O grupo foi responsável pela injeção de swing nas música de Bach (compositor do período barroco).
A par dos mais de 50 trabalhos editados e das digressões que os levam a todo o planeta, The Swingle Singers dedicam-se ainda à apresentação regular de “workshops” e outros eventos durante os quais falam de “Swingle Singing” que constitui atualmente uma técnica de canto a que muitos cantores aspiram e que continua a influenciar compositores de renome do jazz britânico.


quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Sagrado Coração da Terra - Sugestão Ana Rabela e Franciele

Primeira formação da banda

O maior nome do rock progressivo brasileiro, o Sagrado Coração da Terra, mais um projeto pessoal do líder Marcus Viana que banda, estréia em 1984 com ótimo LP independente que construiria boa reputação junto ao público no exterior (Japão em particular, onde os LPs seriam relançados em CD antes do Brasil). Viana, com passagem por outros grupos progressivos (com o efêmero Saecula Seculorum), teria alguma participações dignas de nota (como a ótima faixa "Jardim das Delícias", do LP "Nascente", de Flávio Venturini, que ajuda nos coros no primeiro LP do Sagrado) em trabalhos de outros artistas e na composição de trilhas-sonoras para TV (como as da minisséries "Pantanal", e "O Canto das Sereias", da Rede Manchete, além do tema de abertura da novela "Que Rei Sou Eu?" da Rede Globo, extraído do LP "Flecha"). Viana lançaria também álbuns-solo paralelamente às atividades da banda.
Depois de "Flecha", ainda pela Arteciência, e "Farol da Liberdade" (com alguns temas das citadas minisséries), já pelo seu próprio selo Sonhos & Sons, o Sagrado editaria seu quarto trabalho com Viana, Augusto Rennó (violão e guitarra), Ivan Correia (baixo), Lincoln Cheib (bateria) e Bauxita (vocal): o CD Grande Espírito de 1994 – é esse o álbum que posso copiar pra quem se interessar em conhecer o trabalho do Sagrado.

Guitarristas
Alexandre Lopes, Chico Amaral, Fernando Campos, Augusto Rennó, Alysson Lima

Baixistas
Edson Plá, Mauriti, Jiló, Caio Guimarães, Ivan Correia, Alysson Lima, Gauguin, Paulinho Carvalho

Bateristas
Zé Arthur, Porquinho (Sérgio Viana), Zé Luís, Marco Antonio Botelho, Nenem, João Guimarães, Lincoln Cheib, Limão (André Queiroz), Mário Castelo, Eduardo Campos

Tecladistas
Cristiana Ramos, Inês Brando, Ronaldo Pellicano, Lincoln Meirelles, Zé Marcos, Giácomo Lombardi

Vocalistas
Marcus Viana, Vanessa Falabella, Carla Villar, Rosani Reis, Paula Santoro, Bauxita, Paula Vargas, Rosina Minari

DISCOGRAFIA
Sagrado (1985)
Flecha (1987)
Farol da liberdade (1991)
Grande espírito (1994)
A leste do sol, oeste da lua (2000)
Sacred heart of heart
Coletânea I - Canções
Coletânea II - Instrumental

Abaixo colocamos dois textos escritos por Marcus Viana em 1979, ano da criação da banda. Eles representam bem as opções ideológicas desse trabalho, característica que podemos perceber claramente em suas composições, no CD Grande Espírito inclusive.

O SIGNIFICADO CULTURAL DO TRABALHO DO SAGRADO CORAÇÃO DA TERRA

Trabalhando com instrumentos eletro-acústicos e herdeiro de uma forte tradição erudita, a música do Sagrado Coração da Terra evoca a atmosfera barroca das montanhas de Minas.

Mesmo assim seria impossível enquadrá-la como regional. É uma viagem pelo tempo e pelo espaço às origens e ao futuro de toda experiência musical humana.

Os instrumentos são os usados na tradição clássica: a guitarra, o piano e o violino, porém tratados eletronicamente; uma nova linguagem, o som dos nossos tempos.

O efeito que uma orquestra causava numa platéia do século XIX não nos atinge da mesma maneira: nossa audição está duramente comprometida pela saturação dos decibéis das grandes cidades.

Por isso, utilizamos uma roupagem eletrônica nas músicas. Elas são a fusão de toda experiência do eu inconsciente, guardada na memória do espírito: são lembranças orientais, ciganas, indianas e árabes. E ibéricas! Como negar? O Sagrado teve naturalmente a influência de mestres clássicos devido à formação erudita de Marcus Viana como violinista de sinfônica; principalmente da música de Wagner, Debussy, Ravel, Stravinsky e Villa-Lobos. Existe uma forte raiz afro-ameríndia que se manifesta cada vez mais em nosso trabalho, inclusive com a inserção de músicas com textos traduzidos inteiramente para o Tupi-Guarani e dialetos indígenas como o krenak e yanomame.

Nossa proposta é uma ponte entre a música instrumental e a música vocal; assim sendo, são canções orquestradas, sinfonias cantadas, histórias contadas.

Da mesma forma que os textos, a música está ligada a uma filosofia ecológica: Ecologia da Terra, Ecologia da Mente, do Coração e do Corpo.

O Sagrado Coração da Terra é mais que um projeto; é quase que um movimento filosófico, englobando mensagens visuais, gráficas e sonoras, cujo tema básico é a regeneração do Homem e do Planeta.


POR QUE SAGRADO CORAÇÃO?

De um tema folclórico mineiro, de uma tradição religiosa muito antiga, vem o arquétipo do Sagrado Coração: um fulgurante coração em chamas envolvido em uma coroa de espinhos. O íntimo “real” do homem encarcerado pela fúria de nossos tempos. Um retrato do amor em nossa época: um coração que brilha ainda que ferido e aprisionado nas celas das megalópoles. Uma vida que nenhuma coroa de espinhos vai sufocar, um amor que opressão alguma impedirá que se alastre como uma fogueira e incendeie a fria noite de nossos tempos. Épico e Intenso!

Cantamos a alegria e o amor da tão sonhada Era de Aquário. Não enxergamos com muita clareza, naturalmente; ainda não é exatamente a manhã do sol de Aquário. Seria antes aquela hora crepuscular, entre a noite e o dia que os romanos chamavam Silencium, a hora dos mortos e dos nascimentos. É a hora do despertar.

O homem de nossos tempos desenvolveu sua parte técnica, intelectual e esqueceu-se de sua parte ética, espiritual. O que temos? O macaco-gênio o primata vestido de astronauta brincando com sofisticadas máquinas de destruição; arrasando o planeta, destruindo a própria espécie, poluindo a água, envenenando o alimento e o ar. Essa é a coroa de espinhos do coração. Não estamos preparados para as megalópoles, mas aqui estão elas. Brutalmente reais. O egoísmo é a mola desse salto no abismo, do qual participamos, apesar de gritarmos que somos inocentes. Como pois fazer música por padrões regionalistas, indiferente à tremenda pressão das transformações do Todo? E como sentir a verdadeira música se o espírito está insensibilizado pela dor e pelo ódio do cotidiano urbano?

Nosso comprometimento único é com a Arte, pura e simplesmente. E por Arte, queremos dizer Ciência, Espírito, Consciência, Compreensão. Nossa meta: a precisão em transmitir a consciência viva do universo codificada em mensagem sonora. A música age como a mais poderosa energia moderadora do sistema nervoso humano. Viver e transmitir a música torna-se mais que necessidade; é uma responsabilidade numa civilização que vive um processo vertical de auto aniquilamento. Para iniciar o processo ascencional torna-se necessário apurar os sentidos; temperar o aço da mente; forjar o espírito para que se possa receber e assimilar uma nova energia que se faz cada vez mais presente à medida que nosso mundo naufraga. Inteligência naturais, criadoras e infinitamente poderosas se manifestam nos sistemas nervosos mais avançados. A música abre um canal de saída para o oceano de harmonia e vida do universo. Esse canal não pode ser atingido por nenhuma forma de pensamento ou raciocínio, mas a intuição conhece o caminho. A Arte alimenta a intuição; ocorrendo essa sensibilização, a energia mental gradativamente circula livre pelo novos circuitos do sistema nervoso, até então desconhecidos, e que por serem parte da consciência cósmica coletiva e genética, contém informações de inteligências superiores.

O Arquétipo do Sagrado Coração assim se manifestou e viemos a entender a coroa de espinhos como o próprio processo dual da natureza. Numa visão primitiva seria o Bem e o Mal, Deus e o Diabo, o Ódio e o Amor, a Ignorância e o Conhecimento. Porém ao mergulhar mais fundo, além do apêgo às formas racionais, vimos o Tudo e o Nada; a Eletricidade e o Magnetismo, o Positivo e o Negativo, o Yang e o Ying, a Noite e o Dia, o Homem e a Mulher, o Pai, a Mãe. E no centro, o fruto do Amor das duas forças entrelaçadas do universo: o filho, a força neutra, a criação. O Coração.

Site: http://www.sonhosesons.com.br/pgsagrado.htm

Franciele e Ana Paula Rabelo